Este canapé imponente, de grandes dimensões, é totalmente revestido com tapeçarias dos Gobelins e apresenta nas extremidades dois assentos triangulares. Esta tipologia de canapé – à confidents – faz parte de um conjunto de móveis criados no século XVIII, época do apogeu da criatividade e do virtuosismo dos ebanistas e marceneiros franceses.

 

 

A estrutura do móvel (madeira de nogueira e faia dourada a folha de ouro) apresenta decoração escultórica de grande riqueza. No remate superior, uma aljava com setas cruza-se com um facho em chamas, presos por uma fita. Sobre este conjunto estende-se para os dois lados uma grinalda de flores, onde predominam as rosas e bagas esculpidas em alto-relevo, terminando em cornucópias de onde jorram mais flores.

 

 

Toda a marcenaria é percorrida por um friso com uma grinalda de flores dourada a folha de ouro. Este canapé foi uma encomenda para o salão de Verão das tias de Luís XVI, no Palácio Bellevue, e apresenta a estampilha de Jean-Nicholas Blanchard, mestre marceneiro, que teve a colaboração do escultor Barthélèmy Mamès Rascalon.

 

 

No princípio de século XIX, o canapé esteve no Palácio das Tulherias, nos aposentos de Napoleão, indo depois para o Palácio de Fontainebleau. Vendido no decorrer do século XIX, pertenceu à Coleção Guiness, em Londres, e depois à Coleção Hamilton, em Edimburgo. Veio posteriormente para Lisboa, para o Palácio Foz, após ter sido comprado na venda da Coleção Hamilton, no âmbito das aquisições feitas pelo Marquês da Foz para a remodelação interior do palácio. Em 1901 o canapé voltou para França, depois de ter sido vendido no leilão dos bens do Palácio Foz.

A tapeçaria do estofo não é original. Segundo P. Verlet, o revestimento primitivo seria uma seda azul e branca. Sabe-se que em 1807, quando o canapé se encontrava no Palácio das Tulherias, o estofo já era o que podemos observar atualmente. Esta tapeçaria, produzida pela Manufatura dos Gobelins na segunda metade do século XVIII, apresenta um fundo com desenhos de folhas em dois tons de encarnado (carmesim), criando um efeito adamascado.

 

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Tanto as costas como o assento têm dois grandes ramos de flores atados com fitas de riscas azuis e grandes laços. Este tecido terá sido feito para um canapé direito e teve de ser adaptado a este, de silhueta diferente. Pensa-se que terá sido executado com base num cartão da autoria de Maurice Jacques, provavelmente com a colaboração de Louis Tessier. Estas tapeçarias terão sido executadas no ateliê de Jacques Nielson, na Manufatura dos Gobelins.

 

Clara Serra
Conservadora do Museu Calouste Gulbenkian

A produção de cerâmica na Pérsia seljúcida concentrou-se essencialmente em dois grandes pólos, que eram também dois dos mais importantes centros urbanos no final do século XII e no início do século XIII: Caxã e Ray, a capital dos seljúcidas (reinantes na Pérsia entre 1038 e 1184). As duas cidades eram responsáveis pelo grosso da produção da cerâmica de luxo, de brilho metálico e minai.

A produção de cerâmica na Pérsia ascende ao século XI, herdeira de uma tradição de objectos luxuosos com raízes no mundo islâmico desde o século IX, produção que se desenvolveria de forma bastante significativa no Egipto fatímida. É provável que o apogeu da cerâmica iraniana dos inícios de Duzentos se deva também à migração de ceramistas egípcios aquando do declínio desta dinastia, entre os finais do século XI e a primeira metade do século XII.

Certo é que uma das grandes referências para a produção cerâmica na Pérsia, como em boa parte do mundo islâmico, continuou a ser a cerâmica chinesa – com a sua porcelana fina e uma decoração em que o azul dos desenhos e o branco do fundo são dominantes –, importada através dos portos do Iémen e transportada pela Península Arábica para a bacia do Mediterrâneo, a Pérsia e a Ásia Central.

O desenvolvimento técnico que permitia pintar sob e sobre o vidrado mate contribuiu grandemente para o sucesso da cerâmica minai – ou de esmalte –, em que cada peça constituía um precioso objecto de aparato. As peças eram sujeitas a um complexo processo de cozedura, uma primeira vez a temperaturas mais elevadas e uma segunda a temperaturas abaixo dos 600 graus, para permitir a fixação dos pigmentos mais frágeis, incluindo o ouro.

A peça em análise, decorada predominante a azul e branco, mas contendo também pigmentos verde e negro manganês e apontamentos de dourado, apresenta, ao centro, um personagem sentado, que parece escutar uma narração (representando provavelmente o encomendador da peça), rodeado por quatro figuras também sentadas, provavelmente dois narradores – as figuras diferenciadas, a verde e negro, que assumem uma postura mais activa, encenada – e outros dois ouvintes – a azul, como a figura central, e numa pose mais contemplativa.

Entre as figuras foram desenhadas palmas decorativas, em disposição radial. Na borda interior foi introduzida uma pseudo-inscrição em caracteres brancos sobre uma barra de fundo azul, numa altura em que a caligrafia assumia um valor decorativo cada vez mais significativo na arte islâmica.

Na borda exterior, uma inscrição em caracteres nashki reproduz um poema do famoso poeta Motanabbi, que morreu no ano 968 d. C., situação comum na iconografia persa dos séculos XIII-XV, que representa com frequência poemas e temas heróicos na cerâmica e em iluminuras:

No dia da separação tal foi a minha angústia que o temor tornou o meu corpo velho e decrépito. E a distância trouxe uma separação entre os meus olhos e o sono suave. A minha alma reina num corpo que se tornou delgado como um vime. Se uma brisa passar pela minha roupagem nada ficará a descoberto – para descrever a minha magreza bastará dizer que eu sou um ser que tu não descobrirás se eu não te opuser resistência.

 

Jorge Rodrigues
Conservador do Museu Calouste Gulbenkian
O autor não escreve segundo as normas do acordo ortográfico de 1990.

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